de: ANTÓNIO COSTA PINTO , DIOGO RAMADA CURTO e MANUEL SOBRINHO SIMÕES
19/01/2014 - 01:12
O frágil e muito promissor edifício da investigação científica construído em Portugal nas últimas décadas está em risco. Risco sério: porque poderemos a breve prazo vir a recuar para ocupar de novo o lugar na cauda da Europa. Centros, laboratórios, programas de investigação e candidaturas a bolsas têm sido afectados por cortes brutais de financiamento público, capazes de provocar descontinuidades e impor bloqueios. Mas o pior é que este recuo pode não estar associado apenas à crise financeira que o país atravessa e que obviamente compreendemos, mas a opções numa área que representa muito pouco na despesa do Estado – e dos fundos estruturais da União Europeia, sublinhe-se – e é uma alavanca decisiva para a modernização de Portugal.
Em paralelo, os critérios e os processos de avaliação dos concursos da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) têm-se revelado pouco claros e transparentes. Sobretudo, a avaliação dos concursos de 2013 causou situações de uma injustiça gritante que urge resolver. As constantes mudanças de regulamentos, a falta de planificação, as permanentes alterações dos prazos, e a confusão burocrática anexa, caracterizam infelizmente os programas que têm sido lançados, ao que acresce o perigo de regresso a um modelo clientelar e não meritocrático de avaliação pelo pares.
Será necessário perceber se a FCT tem uma estrutura funcional capaz de dar conta do edifício científico. Para isso, será necessário pôr o dedo na ferida e perceber até onde vai a falta de recursos, materiais e sobretudo humanos, e como evitar uma excessiva dependência de calendários circunstanciais impostos pelo Ministério das Finanças ou das apetências clientelares pelo fundos estruturais que aí vêm. Ou seja, como pode a FCT criar as condições de estabilidade para defender a autonomia da ciência?
Preocupa-nos também a desorientação geral com que têm sido tratadas as candidaturas das mais jovens gerações. Partilham elas expectativas e compromissos que são defraudados sem complacência. A geração situada entre os 30 e 40 anos – que se tem imposto pelos seus currículos de investigação guiada pelos melhores padrões – corre o risco de ser varrida, perdendo-se o investimento realizado nas últimas duas décadas e regressando-se ao atraso paroquial de onde saímos há ainda muito pouco tempo.
Estamos conscientes que, quando as taxas de sucesso em concursos públicos para a investigação (bolsas e projectos) baixam para números risíveis, quase seria preferível não abrir os mesmos concursos. Mantê-los equivale a continuar um simulacro de “excelência” e “internacionalização”, em que por vezes o custo dos avaliadores acaba por ser superior ao número de bolsas atribuídas. Ora, em “casa onde não há pão” e onde as regras deixam de ser claras, criou-se todo um clima de suspeição, resultado directo do desinvestimento e do reforço dos poderes das clientelas.
Os apoios à investigação dependem do reforço das boas instituições e dos bons investigadores e projectos, avaliados correctamente e por critérios rigorosos (outra conquista recente que nada tem a ver com a existência de menores recursos). Acreditamos, pois, que seria fundamental, em relação às instituições, recompensar as melhores e “reformar” as piores.
As carreiras de investigação como as de professor nas universidades estão fechadas. E o modelo de crescimento das universidades e dos centros de investigação, se existe, faz-se à custa de trabalho precário, contratos de poucos anos, chegando até aos cinco meses para cobrir apenas o semestre. Por sua vez, os riscos de não fomentar a autonomia e a liberdade na criação da ciência são enormes, se não se respeitarem as diferentes escalas. Por exemplo, a simples vinculação das bolsas individuais a projectos faz desaparecer temas e objectos de enorme potencial inovador, que se não fazem parte da agenda do “grande professor” não existem. A passagem de todas as bolsas de doutoramento para as universidades elimina a liberdade de alguns estudantes escolherem instituições internacionais de ponta nas suas áreas. Também é de recear que as agendas de investigação, progressivamente dominantes nos centros de investigação, sejam cada vez mais a agenda dos decisores políticos de circunstância e dos naturais interesses que os apoiam. Por todas estas razões, impõe-se a defesa da autonomia, da liberdade científica e da investigação fundamental, guiada pela avaliação rigorosa da qualidade e do impacto na comunidade e na sociedade.
Porque não aceitamos que se destrua o processo de criação de um ensino superior feito no contacto permanente com a investigação científica, lutamos pela autonomia, mas não podemos prescindir dos recursos financeiros que a sustentam. Tão-pouco podemos aceitar que o futuro das gerações mais jovens de investigadores altamente qualificados fique hipotecado e seja, pura e simplesmente, espatifado.
É natural que, num período de crise, os escassos recursos sejam canibalizados pelos interesses mais poderosos e o próximo exercício dos fundos da União Europeia vai torná-lo seguramente mais claro. Mas esperamos que seja respeitado o consenso em torno da ideia de que o investimento em investigação científica é, de facto, o mais rentável para que o desenvolvimento do país não seja apenas aparente.
Investigadores e professores universitártios
DAQUI
Os alertas, os reparos, a chamada de atenção para os efeitos nefastos destas medidas chegam de todos os quadrantes. Quem os ouve? Quem tem o bom senso de não agravar aquilo que já está tão mal?
ResponderEliminarNa conjuntura política actual acho que nenhum tem bom senso e tudo fazem para destruir/impedir o progresso que adquirimos ao longo de 40 anos...dura realidade em "todos os quadrantes".
EliminarE que trio!!
ResponderEliminarMas será que o ministro a lê?
Duvido!!
Beijinhos
Para mim Nuno Crato foi a maior decepção. Um homem que fora da política foi o que foi e os seus livros são brilhantes...entrou para esta máquina devoradora de tudo sobretudo de "ética e valores morais para com o povo"...tem feito tudo contra o que "debitou" na escrita.
EliminarNão sei se irá ler...mas só lamento uma coisa ...o afastamento de Mariano Gago, esse sim...fez tudo pela educação.
Enfim!
Querida amiga, neste momento não consigo ler textos grandes.
ResponderEliminarBeijocas
Compreendo e aceito amiga, está à vontade:)
EliminarRecomendo que vejas, com atenção, isto:
ResponderEliminarhttps://www.youtube.com/watch?v=mToC3pBFdQI
Por acaso eu vi o programa, não domino tudo como é óbvio...mas, pelo que ouvi da boca do painel de convidados, deu-me a entender que infelizmente estamos a retroceder décadaa em todas as frentes a nível da ciência e quer para avaliadores, mas sobretudo para os avaliados... a coisa está preta e algo está errado na FCT!
EliminarNão é por acaso que ontem ou hoje se demitiram dois dos avaliadores por verem a sua avaliação ter sido alterada...foi em sociologia. Em Dezembro foi na Arquitectura...e o resto em que ficamos? Crato está completamente PERDIDO e isto JAMAIS ACONTECERIA COM MARIANO GAGO que era senhor para bater com a porta depois de dar um murro na mesa!
Já agora lê isto:
http://www.precariosinflexiveis.org/?p=9449
Estas criançolas pensam que investigação produz resultados imediatos? Há que queimar muitos neurónios com total dedicação e empenho e caramba só tenho pena que TODOS, MAS TODOS OS INVESTIGADORES NÃO SAIAM DE VEZ DO PAÍS...que depois queria ver como é ficaria "meia dúzia que não descolam da poltrona" só porque...olha sabes amigo? Até eu ia embora se pudesse!!!!
BFDS!!
ResponderEliminarBeijinhos
Bom fim de semana para ti e todos os teus.
EliminarBeijos
Parece que o 25 de Abril ainda não aconteceu, hehehe. :P
ResponderEliminarBom fim-de-semana! :)
Tu és tramado LOL:)
EliminarBom fim de semana e tudo de bom
É assimamodos que um passo para afrente edois para trás, o que tem acontecido é, que neste momento, só andamos para trás,em todas as frentes
ResponderEliminarKis:=(
Tal e qual...e pobres de todos os que dão dirariamente os neurónios em prol de...e não desistem porque adoram o que fazem. É triste...retroceder em tudo e a meu ver não era preciso tanto corte CEGO!!!
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